Demorei a escrever este texto porque, para mim, ele é o mais importante até agora. É onde, de fato, eu inauguro a escrita do que julgo ser meu-futuro-livro-mais-proeminente. Quero conseguir abarcar, do melhor jeito possível, toda complexidade e beleza que há por trás do que chamo de Mercado da Intimidade.
Bom, tudo começou quando eu decidi criar meu perfil em um site de acompanhantes e o motivo por trás disso.
Eu era uma menina que pouco viveu a famosa ~vida de solteira~. Vim de uma criação conservadora: meus pais sempre zelaram pela minha segurança, especialmente quando eu era mais jovem e, por óbvio, mais inocente - e é por honrar esse cuidado que eles sempre me proveram e me ensinaram que eu prezo pela minha segurança em cada encontro. Na adolescência, eu não frequentava baladas, não dormia na casa de colegas e não tinha namoradinhos. Depois disso, iniciei um relacionamento que durou 6 anos e, quando terminou, eu não conhecia muito bem como era ser solteira, especialmente nos tempos atuais, em que esse modelo ganha formas mais fluidas: mais superficiais em qualidade e durabilidade. Estranhei.
Eu estava acostumada a me doar e a perceber o outro também entregue a mim e foi um choque quando entendi que hoje o que se vive são momentos fugazes. Especialmente em tempos de aplicativos de encontros, a minha sensação foi de que todos estão buscando por momentos de menos conexão da alma e mais prazer do corpo. Isso não me contemplava, mas, ao mesmo tempo, eu não queria entrar em um novo relacionamento. Curiosa que sou, fui em busca de entender onde eu poderia criar espaços de ~intimidade~ na vida de solteira.
Aprendi, com as experiências de vida, que mesmo questões difíceis e complexas podem ser resolvidas se a gente tiver repertório de possibilidades, coragem para suportar o ônus e cautela para evitar problemas maiores. Eu amo desafios que me colocam a criar e a experimentar a vida por um modelo único e que se desdobra para mim mesma um pouco mais a cada experiência, a cada novo conhecimento adquirido, a cada autopercepção compreendida. Sou amante insaciável do que (também inaugurando o termo) chamo de Autociência. Eu sou meu próprio laboratório de sensações e sentimentos, por isso não busco o que é bom, nem fujo do que é ruim – esses conceitos têm pouca importância. Eu gosto do que me leva do ponto A ao ponto B de mim mesma; eu gosto do que traz insights e metanoias; eu gosto de sentir que eu hoje vou dormir com um pouco mais de autoconhecimento do que eu acordei. Para fazer Autociência, é preciso cultivar a convivência com a amoralidade (ou, por vezes, com a imoralidade) e todo o ônus que vem com isso. É preciso estar em paz com a própria companhia, com o ansiogênico silêncio e buscar se haver com o vazio que existe em algum cantinho de todo ser humano. É preciso ter a audácia de nos percorrermos nos lugares mais insalubres de nós mesmos. É preciso conviver com uma série de desafios ao longo da jornada, mas o bônus… ah o bônus! Desse eu definitivamente não abro mão.
Foi esse bônus que me mostrou qual é o caminho que me enobrece. Pode ser questionada pela moralidade da nossa cultura, mas, para mim, se apresenta como uma trajetória virtuosa. Esse caminho nem é entrando em um relacionamento novo apenas por querer fugir da vida de relações vazias e nem é sendo solteira e me deparando a cada novo encontro com pessoas que não vivenciam a troca genuína, mesmo que por poucas horas. Por lealdade a mim mesma, fui em busca da minha jornada, mesmo que pra isso eu precisasse abrir trilha em uma terra inóspita.
Encontrei com tipos diferentes de homens, para testar se era uma questão geracional, se era de uma ou outra classe social, se era do brasileiro ou se outras culturas também estavam contaminadas por essa superficialidade; li autores que debatem e criticam a atualidade por prismas mais completos do que a minha análise sociológica poderia alcançar, como Bauman e Byung-Chul Han. Compreendi, por fim, que deveras as relações humanas estão perdendo contornos e estamos, por uma série de motivos, cada vez mais individualistas e preocupados com nós mesmos - e eu entendo os motivos que nos levam a isso. Repare: não coloco qualidade nessa afirmação - bom ou ruim -, apenas reitero: não me contemplam trocas assim.
Então, me perguntei: deve haver outras pessoas como eu, que também sentem falta dessa intimidade de alma, mas como encontrá-las?
Já sei! Vou mostrar quem eu sou em uma vitrine para onde olham as pessoas que estão em busca de outras. E foi aí que eu encontrei eco no lugar mais contra-intuitivo: os sites de acompanhantes. É engraçado né?! Mas é nesse tipo de solução que eu adoro pensar… as mais inesperadas e exclusivas. Elas me divertem e me fazem sentir ousada. Deve ser obra do arquétipo-do-rebelde que me acompanha desde a infância. Hahaha
Foi me divertindo que eu desenhei o que seria minha aventura por esse universo - por isso, o meu livro “Erros” é uma grande celebração do brincar. Minha vida se faz encontrando modos de solucionar problemas complexos do jeito mais risonho e leve possível. A metáfora, a ilustração, a recreação, a arte e todas as formas de “encenar” uma situação têm por objetivo fazer a estrutura psíquica chegar a resolução ou prevenção de possíveis problemas, seja por dificuldades vigentes ou por antecipação - aliás, tem um vídeo do psicanalista Emanuel Aragão falando sobre o ato de brincar de todos os mamíferos que eu considero o supra-sumo do YouTube (vou deixar o link ao final pra quem se interessar).